“Foi um serial killing, aberração serial cometida arrogantemente ao longo de dez dias consecutivos: a Folha errou ao publicar o texto, errou no dia seguinte, incapaz de desculpar-se perante os leitores, errou quando não prestou atenção à primeira e breve reprimenda do ombudsman (domingo, 29/11), errou quando localizou o pivô do episódio e colocou em sua boca uma condenação ao texto e não à decisão de publicá-lo, e errou ao silenciar por tanto tempo diante de um desvio de conduta destas proporções. O ouvidor identificou outros erros, todos gerados pela mesma onipotência.” Alberto Dines, Observatório da Imprensa
Sem eleições ou qualquer outra prerrogativa, o jornalismo garantiu para si o quarto poder. Com o poder em mãos, institui-se como o detentor da verdade, aquele que discorre fatos assim como estes verdadeiramente o são. Daí a necessidade de verificar o assunto sobre o qual se discorre, de procurar fontes precisas, de ver os ‘dois lados da moeda’. Pois, assim, mesmo que a notícia não fosse/seja imparcial, visto que um texto é carregado ‘do nosso olhar’, ‘do nosso jeito’ (a gente se denuncia), as informações fluiriam de modo responsável, e, porque não, carregadas de verdades – mas, distantes de serem absolutas.
Principal instrumento para a construção da realidade, o jornalismo usurpa, frequentemente, os direitos que conquistou ao longo dos anos. Então, constrói realidades que não são, de fato, realidades. E, os que circulam por trás deste instrumento, que, na maioria das vezes, colocam-no para funcionar, rendem-se ao joguete, lançando informações imprecisas, assuntos não fidedignos, pautas chulas. É a prática do jornalismo maldito, em todos os sentidos.Independente de sexo, raça, cor ou partido, todos sabemos que há limites. Somos capazes de identificar quando um assunto é deveras impertinente e inconveniente. Contudo, a Folha de São Paulo, o maior jornal impresso do Brasil, não soube.
No dia 27 de novembro, a Folha publicou um artigo de César Benjamin, intitulado de “Os filhos do Brasil”, que, entre outras coisas, acusava o presidente Lula de tentar estuprar um jovem companheiro de cela. O quê? Quando? Onde? Por quê? Então...Benjamin, em seu brilhantíssimo artigo, conta de uma conversa que teve com o presidente e que ele lhe teria revelado a tentativa de subjugar um colega de cela, João Batista dos Santos (ex-militante do Movimento pela Emancipação do Protelariado – MEP), quando estiveram presos, por um mês, na época da ditadura militar, alegando que não conseguia ficar sem sexo (Óh!).
Teria mesmo o presidente da república falado isso? Bom, não sabemos. A versão da Folha nos dá pouca coisa, há somente um viés, o de César Benjamin (e os ‘dois lados da moeda’?). E, ele afirma o ocorrido (e ponto). Vamos à internet. Ah, a internet: inúmeras possibilidades e um bombardeio de pontos de vistas. É lá que encontramos os outros vieses. Lá que a verdade vem à tona. Lula, pelo que consta, não tentou seduzir ninguém. Ele teria (ainda não se sabe se disse ou não) dito mais ou menos o que Benjamin conta, mas em tom de brincadeira – de mau gosto, evidente.
O assessor do presidente garantiu que Lula ficou triste com a publicação do texto, ressaltando que sobre o assunto nada seria feito. “Vamos dar a mínima importância. Quando o assunto é sério, a gente reage, quando não é..”, explicou. Alguns veículos foram atrás do jovem João Batista dos Santos, hoje com 40 e poucos anos de idade. Inicialmente ele se recusou a dar entrevista formal e ser fotografado, afirmando que nada tinha para comentar sobre o assunto. Depois, acabou dizendo que soube do artigo logo no dia seguinte, quando começou a receber ligações de vários jornalistas e antigos companheiros.
“Foi uma situação constrangedora”, afirmou. Santos disse que não conhece Benjamin e acredita que Lula "deve estar chateado" com o relato do colunista. A mulher de João Batista, que nunca tinha ouvido falar da suposta tentativa de estupro, denominou o artigo de “baixaria”, e agora teme dos filhos sofrerem no colégio com possíveis brincadeiras de mau gosto - heranças de um jornalismo maldito (e ponto!).
César Benjamin é apenas um sintoma
ResponderExcluirParticipei do repúdio à “Ditabranda”, mas não fui ao protesto contra o artigo de César Benjamin. Acho que a celeuma lhe conferiu visibilidade desnecessária e alimentou uma ilusória vocação “polemista” da Folha.
É incrível que o jornal tenha descido a esse nível de vulgaridade. Há alguns anos, seria inimaginável que qualquer veículo publicasse um texto acusando o presidente da República de querer sodomizar alguém na cadeia (tecnicamente, “atentado violento ao pudor”), apenas porque um colunista obscuro decidiu combater a popularidade do mandatário.
Parece fácil, para Antonio Cicero e outros, defender essa liberdade opinativa de mão única. Mas ninguém consegue explicar por que nenhum governo jamais foi atacado de maneira tão grosseira, descarada e inescrupulosa. De erro em erro, a cada suposto “deslize” porcamente corrigido, constrói-se a metodologia difamatória que está reduzindo o jornalismo brasileiro ao achaque ideológico.
A truanice de Benjamin é exemplo menor, infantil até, de uma tendência que teve episódios muito mais graves e conseqüentes. Mas ela serve como anúncio do que nos aguarda nas batalhas eleitorais vindouras.