domingo, 16 de janeiro de 2011

Embrulho

Acordou com ânsia da cama onde estava. Cheirou o lençol, que cheirava bem. A ânsia era do quarto, mas o quarto também cheirava bem. Levantou e andou pela casa, deu ânsia da casa inteira. Embrulhou o estômago ao pensar na cidade que morava, nas pessoas com quem se encontrava. Deu azia da rotina. De repente, ficou enjoado da vida.
Com a cara amarrada, listou em pensamento aquilo que fez seu estômago ficar mal, causando-lhe aquele mal estar súbito. A lista nem ficou tão grande, mas era excessivamente tediosa. Como não percebeu esse tédio impregnado em seus pertences e afazeres antes? Frisou a testa procurando o início de tudo. De onde vinha essa monotonia que lhe provocava uma insatisfação aguda?
Não achou os indícios. Ficou bravo consigo mesmo. Pensou em quebrar tudo. Depois da demolição restam os entulhos. E se por ventura quisesse reaproveitar algum? Sucedeu-lhe uma ideia melhor. O abandono. Iria embora da sua própria vida para nunca mais voltar. Não carregaria móveis, roupas, trabalho, amigos ou família. Daria adeus ao passado chato em busca de um futuro mais variável. Queria correr riscos. Perigo. Antes de dar o fora, avisou-a da decisão. Sem entender nada, ela deu a mão a ele. Foram.

2 comentários:

  1. Eu queria dar a mão a ele e sair assim também. Agora. Afinal, o que sobrará no final a não ser as mãos dadas?

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  2. Lindo, Lari. Que bom que estavam em sintonia. Que se bastavam. Lindo.

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Porque quem comunica se trumbica.