terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Um parceiro para dançar na vida

Pelas manhãs, suco de laranja, um pão, às vezes dois. Gostava de tomar o café da manhã com calma, degustando a comida, que nem era tanta, e, principalmente, o raiar do dia. Apreciava aquele momento: o sol iluminando o dia, despertando pessoas, cores. Acordando a vida. Enchia-se de graça, espreguiçava-se.
Trocava de roupa, verificava se tinha desligado tudo, se as portas e janelas estavam devidamente fechadas. Acariciava o cachorro ao colocar mais água na sua tigela. Pegava a pasta preta e a bolsa. Checava pela quarta vez, talvez quinta, a bolsa. Tinha tudo o que precisava ali? Protetor solar, escova de cabelo e de dente, creme para quando as mãos ficassem ásperas, pasta de dente, perfume, óculos de sol, de grau, caneta, a carteira, os documentos, chaves, além de pilhas de papéis – alguns eram contas, outros eram pensamentos que lhe surgiam e anotava e os demais eram números de telefones. Tudo estava na bolsa.
Jurava para si mesma que não carregaria tanta coisa assim, mas não conseguia se livrar daqueles utensílios, nem dos papéis. Esqueceu da bolsa. Mirou o relógio de parede que, recentemente, pendurou na sala. Era a hora de partir. Era para isso que tinha colocado o relógio ali, para não se atrasar. Depois que ficou sozinha, os atrasos se tornaram constantes. Então, resolveu pendurar o marcador de tempo que tanto lutou para que não fosse pendurado. Achava-o feio, mas agora ele até que era bonitinho. O importante era que não se atrasasse.
Foi para o trabalho. Lá as horas passavam rapidamente. Entre os barulhos do teclado, telefonemas, ordens, pedidos, reuniões. Risos. A turma do administrativo era divertida. Reuniam-se às quintas-feiras, depois do expediente, para tomar chopp e conversar sobre sexo. Falavam sobre outros assuntos também, mas as sacanagens prevaleciam. Até as esposas e esposos entravam na brincadeira, revelando fantasias.
Voltava para a casa cansada. Meio tonta por causa da cerveja. Abria o portão, colocava o carro na garagem já chamando pelo cachorro que aparecia abanando o rabo. Ao abrir a porta, o eco lhe cumprimentava. Escutava alguns barulhinhos típicos, como do motor da geladeira e do aquário. Tinha esquecido de alimentar o peixe. Sempre esquecia. Não tinha paciência para animais aquáticos, era a desculpa que dava quando o dono do peixe a cobrava. Sentia falta dessa cobrança.
Respirou fundo. Quis dançar. Ligou a música. Podia dançar uma valsa, um tango, forró, até salsa. Se fosse há oito meses, podia dançar mesmo. Ele, assim como ela, era apaixonado por dança de salão. Os dois transformavam a pequena sala em um grande salão de festas, passavam horas a procura do movimento que melhor rimasse com a melodia que escutavam. O cachorro e o peixe eram seus expectadores. Desligou a música. Antes que seus olhos ficassem marejados, decidiu que o seu luto terminaria ali. Amanhã iria dançar. Procuraria um par.

Um comentário:

  1. É bom dançar com outro par, pra variar. Mas que haja sintonia, sincronia e, principamente, risos. Como é bom sapatear por aí...

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Porque quem comunica se trumbica.