sábado, 6 de novembro de 2010

Ai que saudade de ocê!



Era a primeira coisa que João escutava, depois de um longo tempo na estrada. Ficava meses fora, a percorrer o interior brasileiro, de norte a sul, em sua carreta. Quando voltava para casa, a mulher, ao escutar o barulho do caminhão, corria para fora. Ia ao encontro do marido, que antes de chegar ao portão, já a tinha nos braços. Grudada no seu pescoço, repetia sem parar: Ai que saudade de ocê. Ai que saudade de ocê. Ai que sauda...Oxê, pare mulher. To aqui! Ela se calava. E o puxava para dento de casa.
Enquanto João descansava, ela se metia no fogão, de onde saiam os pratos preferidos dele. Cozinhava tudo, tudo aquilo que ele pedisse, que tivesse vontade de comer. Nos meses sem ele, ficava longe do fogão. Não tinha apetite. Com ele em casa, não ligava nadinha de ficar horas na cozinha preparando suas guloseimas. Aproveitava aquele tempo dele ali, na rede, no sofá, na cama. O apetite dela pela comida e pela vida tinha voltado. Era sempre assim. Os dias com ele mais felizes, os dias sem ele, mais amenos. Sem tanta graça.
Ela chegou a sentir inveja e raiva do caminhão, porque o automóvel tinha o marido por mais tempo do que ela. Pensou algumas vezes em ir viajar com ele. Mas não dava certo. João dizia que ela era bonita demais para percorrer estradas, para tomar sol na cara e virar madrugadas. Não queria essa vida para ela. Então, num esforço danado, rodava quilômetros, sozinho.
Tinha vontade de dançar um xote, de dormir na cama, de arrancar o avental da mulher. Assim, a saudade que ele sentia rasgava seu peito. Às vezes achava que a saudade da mulher era pior, porque ela sempre estava no mesmo lugar, com o mesmo sorriso, a esperar. E a espera cansa. Entretanto, os caminhos que fazia sem ela também eram torturantes, também cansavam. Perdeu as contas de quantas vezes quis largar essa vida. Ainda não deu, quem sabe mais para frente. Enquanto isso, aproveita o aconchego de casa e o cheiro dela nele. Fica um mês ali, depois, tem que ir. Viajar de novo.

Um comentário:

Porque quem comunica se trumbica.