terça-feira, 29 de setembro de 2009

E se eu cair?

Já faz um tempo que ouvi de uma amiga que “a Lari doce” já não existe. E a constatação de tal transformação só me ocorre agora. A ficha caiu...Recebi uma notícia, destas que mudam a vida de uma família inteira, que traz esperança, que recicla. Ela é boa, e, apesar de boa, ela, ainda, não me trouxe ânimo. Eu enrijeci e perdi a ternura. Os calos não me permitem pular, abraçar, agradecer. E guardei a felicidade para o momento certo, para o instante em que aquela notícia seja, realmente, oriunda da vida nova, da reciclagem. Do bem-estar. Guardo-a para a hora de me despedir, definitivamente, dos dias sombrios e das lágrimas constantes. Com este adeus eu espero recuperar a minha docilidade. Entretanto, a fortaleza que me transformei – que há tempos não combina com a minha frágil aparência -, impede-me de pensar desta forma. Meus pés ainda não flutuam, permaneço fincada no chão, com as asas podadas. Preciso de mais um tempo, porém, já imagino o dia do meu voo certeiro.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Promoção

Primeira vez que o vejo e ele já vem com um “paixão”. Não deu certo. Detesto paixão, amor e todos os seus derivados: mor, morzinho, morzão...mo. É muita intimidade para pouca coisa, na verdade, por pouquíssimo tempo. Prefiro ser chamada pelo nome mesmo, talvez pelo sobrenome ou um simples você (nessas horas a segunda pessoa do singular soa perfeitamente). Depois vêm as flores, como se elas fossem mágicas e pudessem me encantar. Ele deve imagina que eu as recebo e sinto o cheiro, que emanaria o tal do amor. Seria certeiro. Mas comigo deu errado. Sem flores, por favor, não gosto de flores (mentira, eu gosto, mas se não há química, quem dirá flores). Na seqüência, o celular. Ele não para de tocar. O celular tocando depois daquele semi-encontro me apavora. Deixe-me na expectativa. É gostoso sentir borboletas no estômago, ficar na dúvida. A certeza nem sempre é positiva, eu acho. Em seguida, o grude. Atraio vários chicletes e dos mais variados sabores. Não sei bem porque, vai ver que é o meu signo e os tais dos ascendentes. Não ao chiclete! Ainda não sobrevive a um relacionamento que eu me doe por tempo integral. Eu preciso de ar. O ver todo dia não me enjoa, mas a toda hora, me invade. Mas hoje, tudo bem, eu estou disponível para às 24 horas. Rendo-me à mesmice e à banalidade. Pode começar a me ligar, suporto o “paixão” ou outros apelidos de mau gosto. Me ligue, me mande flores, eu vou adorar - por pouco tempo (é apenas a carência me visitando).

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Meu Brasil brasileiro



Brasil, 07 de setembro de 2009.

Aos cegos que não leem braile

Aqui tudo que se planta dá e tudo que é gente ginga, batuca, canta, mexe, dança. E como dança. Em solos verde-amarelos o rebolado é necessário, a tal da ginga é fundamental. Tem gente que já nasce com ela, herança de família, e outros, para não ficar para trás, aprendem rapidinho a coreografia, e que sintonia! Se não é esperto, se não for do batente, aqui dança. Aqui você só não dança se for bandido, político e ladrão – daí você mesmo cria uma coreografia e comanda os bailarinos, mas esta dança é vulgar. Dela não se deve dançar.
Bandido, político e ladrão à parte. Quero falar do que é bom, porque por aqui todo mundo anda vendado. Fecham-se os olhos para o melhor assim como os fecham para o governo que rouba, para a policia que mata e para lei que não é cumprida. Se a cegueira é o melhor remédio para aquilo que é ruim, pode ser que enxergar o bom seja o melhor meio para fugir da autodestruição (se vemos o bom: valorizamos, cuidamos, protegemos).
O pulmão do mundo está aqui, bem aqui. Todo o mundo já o avistou, menos os nativos (recado de urgência: tirem a venda!). De cada quatro espécies no mundo, uma está por estas matas, todo o mundo já viu, reviu, conferiu. E você? Agora até petróleo o Brasil tem, e todo o mundo ficou de olho, inclusive os brasileiros (Biiiiiiiiiiiiiiiiiii, biiiiiiii – apitou o detector de mentiras, brasileiro ainda não viu). Contudo, mesmo assim, no breu, o pré-sal é nosso. Também teve a crise. Ela veio, e não quebramos. Apontaram-nos como o país do futuro. Ninguém conseguiu ler, a vista, viciada, não deixou.
Aqui tem mulata que faz macarrão, branca que samba e índio que come enlatado, além dos estrangeiros que fazem tudo isto muito bem e com muito gosto. E para essa mistura não se teve/tem receita. O ponto surgiu naturalmente. Misturou tudo, mexeu bem: tá no ponto!
No Brasil tem japonês que é católico, negro que é evangélico e branco que é budista. Têm também os portugueses, italianos, ucranianos, holandeses (e tudo o mais aqui se encontra) que freqüentam terreiros e rezam para orixás. O nome disso tudo é diversidade cultural, porque aqui se tem arte, tem língua, tem crença, tem culinária e hábitos, mesmo que mais da metade da população não saiba, ou melhor, não vê.
Agora, o mais irônico: aqui ninguém se enxerga. A nação verde-amarela é capaz de ver de longe o que os vizinhos fazem, mas é incapaz de avistar o próprio umbigo – talvez por isso fiquem de olho no alheio. A população brasileira é uma das maiores do mundo, e, absolutamente, a mais impar de todas. Os nativos dessa terra são dotados de uma amabilidade única e inigualável. O calor humano do povo daqui é intenso, o afeto transmitido por eles é transcendental. Por isso, com precisão afirmo: foi aqui que inventaram o abraço.
Depois do carinho, o que mais chama atenção nos brasileiros é a arte de saber improvisar, de saber se virar. A arte de se desdobrar e ralar estão no sangue. Corre nas veias deles a força de vontade de viver, de vencer. O porém é que eles não sabem disso. Na verdade, não conseguem ver tanta possibilidade, tanta capacidade, tanta virilidade.
É uma pena que a cegueira coletiva impere no país do futebol e do carnaval – é lógico que o Brasil é muito mais do que isso, se assim falo é porque isto é o pouco que eles conseguem enxergar. Dizem os mais positivos – a minoria, claro - que aqui é um país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza. Eu fico com eles, sim é com certeza.

OBS: Talvez isso aqui não seja uma carta. Talvez os pessimistas continuem pessimistas. Talvez a visão retorne (será que algum dia nos enxergamos?). Talvez o carnaval tenha fim e o futebol azar. Talvez seja só uma névoa. Feliz dia da pátria!

Olhos cor de mel